Aos 47 anos, Marily dos Santos desafia preconceitos e segue ativa em maratonas pelo Brasil

Corredora fala do amor pelo esporte

Aos 47 anos, Marily dos Santos é um exemplo de vitalidade. Com duas participações olímpicas nos seus quase 30 anos de carreira, a maratonista segue ativa em corridas pelo Brasil.Ela esteve na capital no último dia 27 de abril para participar da meia maratona Salvador 21k.

Crédito: Acervo Pessoal

Radicada em Pojuca, na Região Metropolitana (RMS), a trajetória de Marily no esporte começou ainda na infância, no município de Joaquim Gomes, em Alagoas, onde nasceu. Ela conta que participava das gincanas de escola e vencia a maior parte das brincadeiras. Ainda criança, corria do sítio da família até a casa do padrinho para levar recados ao pai, que era agricultor. O trajeto de 14 km era percorrido quase todos os dias. Mas não era só o preparo físico e a rapidez que impressionavam. O espírito competitivo chamou a atenção de seu primo, o também corredor José Carlos Santana, que já participava de maratonas pelo país.

“Quando eu tinha 17 anos, meu primo foi passar as férias lá e percebeu que eu tinha vocação para a corrida. Com isso, ele me trouxe para uma prova em Maceió. Eu fiquei em quarto lugar entre 500 competidoras, mas não recebi o prêmio por causa da idade. Chorei muito nesse dia, mas não desisti”, diz.

Após a frustração em não receber a premiação, a corredora decidiu esperar completar 18 anos para se dedicar de forma integral para o esporte. Ainda assim, ela teria que lidar com um outro obstáculo, a recusa de seu pai em deixá-la seguir sua carreira. “Eram outros tempos, a gente não saía de casa para nada. Como éramos somente meninas, ele não deixava nem mesmo estudar na cidade, estudávamos na roça mesmo. Faltavam poucos dias para eu completar 18 anos, quando eu fugi de casa, numa madrugada, e fui para Juazeiro, na Bahia”.

Em terras baianas, ela contou com a ajuda do primo para treiná-la e, aos poucos, foi ganhando envergadura de atleta. Do interior da Bahia, Marily se mudou para Salvador, com a ajuda do primo, que a apresentou para um treinador na capital, e a jovem atleta começou a treinar e disputar corridas mais importantes e maiores. No entanto, não se adaptou ao estilo de vida da capital e se mudou para Pojuca, onde vive atualmente.

Os bons resultados a levaram para uma corrida em São Paulo, onde competiu com atletas do Quênia, país referência na modalidade.

“Eu fui acompanhando-as e algumas brasileiras cochichavam dizendo que era para deixar a ‘nordestina’ lá que elas alcançariam depois. Elas tentaram, mas quando chegavam perto, eu ‘sumia’ e mantinha minha posição. Terminei em segundo lugar geral e todo mundo queria me conhecer no final”, lembra. O bom desempenho levou Marily para uma competição de 10 quilômetros na Tailândia.

Ela não se intimidou com o fato de estar entre as melhores do mundo e chegou em sexto lugar. Vitórias e bons resultados em competições pelo mundo culminaram no ponto alto da sua carreira: a classificação para a sua primeira Olimpíada, em Pequim, em 2008. Na China, ela se tornou a primeira brasileira a conseguir o “índice A” da prova.

“Até hoje, eu fico me beliscando para ver se realmente sou uma atleta olímpica. Quando cheguei no Ninho do Pássaro, no final da prova, a repórter tentava me entrevistar e eu no mundo da lua sem acreditar que estava ali. Eu vivi muitas coisas e tento passar essa experiência para outras pessoas e mostrar que por mais difícil que seja, não é impossível”, fala. Depois de Pequim, Marily participou dos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016. Atualmente, continua correndo as ruas do Brasil e do mundo. A corrida na capital baiana completou uma sequência de cinco finais de semana de competições em cidades como Aracaju, Capim Grosso e Porto Seguro.

“Eu ainda tenho muita lenha para queimar e muitas corridas para fazer. Não tenho previsão de parar, porque sigo sendo convidada para correr e quanto mais eu corro, mais eu gosto. É uma satisfação contar minha história, passar tudo que eu aprendi para as crianças daqui de Pojuca e dar esse incentivo para elas”, conclui, afirmando que, além do desejo de permanecer correndo e incentivando a nova geração de atletas, há um outro sonho, não menos importante: ser mãe!